Articles
Luciano von der Goltz Vianna
The present article starts from a debate that aims to understand how the disciplinary regimes of Anthropology lead the researcher to follow a protocol of questions and interests in his research. The objective here is to discuss the existing
[+]Articles
Rocío Fatyass
Neste artigo retomo ideias emergentes de um projeto de pesquisa com crianças que acontece em um bairro periurbano da cidade de Villa Nueva (Córdoba, Argentina) e discuto a agência das crianças e sua participação na pesquisa em ciências
[+]Articles
Aline Moreira Magalhães
Since expeditions by naturalists in the 18th century, the production of modern knowledge about the flora and fauna of the Amazon has included people who know the ecosystem from experience. At the National Institute for Amazon Research (INPA),
[+]Interdisciplinarities
Juliana Pereira, Ana Catarina Costa, André Carmo, Eduardo Ascensão
This article draws on the genealogy of studies on the house in Portuguese Anthropology and Architecture as well as on recent perspectives coming from the Geographies of Architecture, to explore the way residents of auteur architecture experience
[+]Dossiê “Beyond penal populism: complexifying justice systems and security through qualitative lenses”
Annabelle Dias Félix, Maria João Leote de Carvalho, Catarina Frois
In the global political landscape, as far-right parties gain prominence, populist rhetoric advocating for harsher justice and security policies is becoming increasingly prevalent. Proponents of this rhetoric base their discourse on “alarming”
[+]Dossiê “Beyond penal populism: complexifying justice systems and security through qualitative lenses”
Susana Durão, Paola Argentin
In this article we argue that hospitality security – a modality that confuses control and care – operates through the actions of security guards in the creation of what we call pre-cases. From a dense ethnography accompanying these workers in a
[+]Dossiê “Beyond penal populism: complexifying justice systems and security through qualitative lenses”
Pedro Varela
Racist police violence is one of the most brutal facets of racism in our society, reflecting structures of power and oppression that marginalize sectors of our society. This paper emphasizes the importance of understanding this reality, highlighting
[+]Dossiê “Beyond penal populism: complexifying justice systems and security through qualitative lenses”
Catarina Frois
This article engages with contemporary anthropological and ethnographic methodological debates by reflecting on the challenges of conducting research in contexts related with marginality, deviance, surveillance, and imprisonment. It examines the
[+]Dossiê “Beyond penal populism: complexifying justice systems and security through qualitative lenses”
Lydia Letsch
Qualitative researchers face unique challenges in the dynamic domain of border regions, particularly when venturing into highly securitized areas with a constant military presence, advanced surveillance, and restricted access zones. This article
[+]Memory
Rita Tomé, João Leal
Falecido recentemente, Victor Bandeira (1931-2024) desempenhou um papel fundamental no desenvolvimento da museologia etnográfica em Portugal. Foi graças às suas expedições a África (1960-1961, 1966, 1967), ao Brasil (1964-1965) e à Indonésia
[+]Lévi-Strauss Award
Jo P. Klinkerfus
This paper is a reduced and synthesized version of the ethnography on PMSC Notícia, the news platform of the Military Police of Santa Catarina (PMSC). Based on news about death, dying and the dead published on the website in 2021, social
[+]Artigos
Antonio Maria Pusceddu
This article mobilizes the ecologies of value as a conceptual framework to account for the conflicts, contradictions and dilemmas arousing from the experience of the contemporary socio-ecological crisis. Based on ethnographic fieldwork in Brindisi,
[+]Artigos
Axel Levin
This ethnographic article addresses the difficulties, practices, and strategies of the professionals of the only Argentine hospital fully specialized in the treatment of mental health problems of children and adolescents. More specifically, it
[+]Artigos
Morena Freitas
The ibejadas are childlike entities that, alongside the caboclos, pretos-velhos, exus, and pombagiras, inhabit the umbanda pantheon. In religious centers, these entities manifest through colorful images, joyful sung chants and an abundance of sweets
[+]Artigos
Pablo Mardones
The article analyzes the Anata-Carnival festivity celebrated in the Andean town of Chiapa in the Tarapacá Region, Great North of Chile. I suggest that this celebration constitutes one of the main events that promote the reproduction of feelings of
[+]Artigos
Marta Roriz
Drawing on anthropological and ethnographic developments in the study of urban tourism, this essay offers a description of Sarajevo’s tourist landscapes from the perspective of an ethnographic tourist, detailing how time is inscribed in the
[+]Memory
Lorenzo Macagno
The article comments on, contextualizes and transcribes the epistolary exchange between social anthropologist David J. Webster (1945-1989) and ethnologist and Portuguese colonial official António Rita-Ferreira (1922-2014) between 1971 and 1979.
[+]Dossier ‘Gender and Care in the Cape Verdean transnational experience’
Luzia Oca González, Fernando Barbosa Rodrigues and Iria Vázquez Silva
Neste dossiê sobre o género e os cuidados na comunidade transnacional cabo-verdiana, as leitoras e leitores encontrarão os resultados de diferentes etnografias feitas tanto em Cabo Verde como nos países de destino da sua diáspora no sul da
[+]Dossier ‘Gender and Care in the Cape Verdean transnational experience’
Fernando Barbosa Rodrigues
Taking the ethnographic field as a starting point – the interior of the island of Santiago in the Republic of Cabo Verde – and basing on participant observation and the collection of testimonies from the local inhabitants of Brianda, this
[+]Dossier ‘Gender and Care in the Cape Verdean transnational experience’
Andréa Lobo and André Omisilê Justino
This article reflects on the care category when crossed by the dynamics of gender and generation in Cape Verde. The act of caring is of fundamental importance for family dynamics in this society, which is marked by mobilities of multiple orders –
[+]Dossier ‘Gender and Care in the Cape Verdean transnational experience’
Luzia Oca González and Iria Vázquez Silva
This article is based on fieldwork conducted with women of four generations, belonging to five families living in the locality of Burela (Galicia) and their domestic groups originating from the island of Santiago. We present three ethnographic
[+]Dossier ‘Gender and Care in the Cape Verdean transnational experience’
Keina Espiñeira González, Belén Fernández-Suárez and Antía Pérez-Caramés
The reconciliation of the personal, work and family spheres of migrants is an emerging issue in migration studies, with concepts such as the transnational family and global care chains. In this contribution we analyse the strategies deployed by
[+]Debate
Filipe Verde
This article questions the consistency, reasonableness, and fruitfulness of the methodological proposals and idea of anthropological knowledge of the “ontological turn” in anthropology. Taking as its starting point the book manifesto produced by
[+]Debate
Rogério Brittes W. Pires
O artigo “Estrangeiros universais”, de Filipe Verde, apresenta uma crítica ao que chama de “viragem ontológica” na antropologia, tomando o livro The Ontological Turn, de Holbraad e Pedersen (2017), como ponto de partida (2025a: 252).1 O
[+]Debate
Filipe Verde
Se há evidência que a antropologia sempre reconheceu é a de que o meio em que somos inculturados molda de forma decisiva a nossa compreensão do mundo e de nós mesmos. Isso é assim para a própria antropologia e, portanto, ser antropólogo é
[+]Debate
Rogério Brittes W. Pires
Um erro do construtivismo clássico é postular que verdades alheias seriam construídas socialmente, mas as do próprio enunciador não. Que minha visão de mundo, do fazer antropológico e da ciência sejam moldadas por meu ambiente – em
[+]Note on the cover
Pedro Calapez
© Pedro Calapez. 2023. (Pormenor) Díptico B; Técnica e Suporte: Acrílico sobre tela colada em MDF e estrutura em madeira. Dimensões: 192 x 120 x 4 cm. Imagem gentilmente cedidas pelo autor. Créditos fotográficos: MPPC / Pedro
[+]Na influente obra de 1735, Systema Naturæ, Carl Linnaeus desenvolveu um sistema de classificação da ‘natureza’ que dividiu em três reinos: animal, vegetal e mineral. Porém, somente nas primeiras cinco edições deste livro, o biólogo sueco incluiu um grupo impreciso, formado por seres imaginários, que designou de Animalia Paradoxa (Linnæi 1735: 65-66). Este ensaio trata de um conjunto de seres, igualmente imaginários e contraditórios, criados em barro pelos artesãos da região de Barcelos, e procura experimentar metodologias de correspondência entre o processo de criação de etnografia com o destas criaturas. Começa por observar-se o aspeto sensorial e háptico da prática de figuração em barro, interrogando que outros métodos, além do etnográfico, possibilitam apreender o trabalho dos barristas, e das entidades que estes inventam com o barro. Conclui-se que a prática artística, e especificamente o desenho, pode promover uma aproximação ao gesto da modelação fantasiosa do barro, praticada pelos artesãos.
Grande parte da bibliografia sobre a prática de figurado de barro sugere que esta arte se limita à reprodução, em cerâmica, da realidade quotidiana observada pelos barristas.[1] Se é certo que muitas peças representam profissões, cenas de festas populares, e outros temas considerados tradicionais, como presépios e procissões, é igualmente visível na região de Barcelos, e também no contexto patrimonializado de Estremoz[2], que os artesãos têm criado entidades que dificilmente observariam no seu quotidiano. São seres contraditórios e fantasiosos que resistem a interpretações e classificações académicas, artísticas, e a tentativas de domesticação institucional.[3]
Imagem 1: Centopeia, de Mina Gallos (2024).
«É imaginar o mundo com um pedaço de barro nas mãos»[4]
Quando questiono os barristas sobre o significado da prática de figurar em barro, respondem-me sem hesitação que este trabalho, que lhes garante o sustento, é igualmente a sua vida. Através da prática de figuração refletem sobre as suas memórias, relações e sonhos. É também a trabalhar que negoceiam o equilíbrio entre a tradição dos temas que aprenderam com os mestres[5], e a criação de novas formas, baseadas nas suas próprias ideias. Portanto, mais do que representar a realidade, os artesãos imaginam o mundo através da modelação do barro, criando modos de relação com o seu ambiente. As ideias para as peças surgem-lhes dos sonhos, das histórias contadas por familiares, e de personagens de contos populares. Alguns barristas já cresceram rodeados por estas estranhas criaturas de barro, como se fizessem parte da família. Eu sigo as pistas que me vão dando, ouvindo e observando o contar dos artesãos, que é oral, mas também háptico (Ingold 2013), pois trabalham com o barro enquanto me contam as histórias da sua prática.
Imagem 2: Mesa de trabalho da autora com obras de Mina Gallos (2024), António Ramalho (2024), e esboços das peças.
«Matéria vibrante»[6]
«Que bichos são estes?», pergunto a Domingos Francisco, a propósito de um grupo de sete pequenas peças em barro: «São os Insetos!» responde prontamente, explicando que são interpretações do que imagina sobre a vida destes animais, mais do que representações factuais: «São o tira-olhos (libelinha), a borboleta, a abelha, a bicha-cadela, a reza (louva-a-deus), a formiga e a joaninha».
Imagem 3: Domingos Francisco no seu atelier em Várzea, Barcelos (2024).
Imagem 4: Insetos (borboleta, reza [louva-a-deus], formiga, bicha-cadela, abelha e tira-olhos [libelinha]), de Domingos Francisco (2024).
As minhas entrevistas e observações da prática de figurado de barro têm sido sobretudo experiências estéticas. Sento-me nos ateliers dos artesãos, impecavelmente iluminados, olhando e ouvindo o seu trabalhar - tiram um pedaço da peça de barro, que primeiro batem e amassam, e depois moldam e alisam. Repetem este processo até finalizarem a peça. Muitas vezes não têm uma ideia pré-concebida, vão fazendo, e é pela repetição dos gestos, e pela relação que estabelecem com o material, que a forma se vai dando a conhecer (Leroi-Gourhan 1993 [1964]). À sua conversa com o barro junta-se a conversa com a antropóloga, em que os barristas mais antigos me contam como apanhavam e tratavam o material em casa, num processo moroso que envolvia toda a família e a ajuda de bois no pisar do barro. Atualmente compram o material já preparado, o que facilita o trabalho, mas requer adaptação às características das novas matérias-primas, cujas particularidades têm de ser apreendidas pelos artesãos.
Durante as observações e entrevistas, e na minha tímida prática participante, pude perceber que a resistência exercida por esta «matéria vibrante» (Bennet 2010) muda consoante a sua densidade, humidade e elasticidade, e o barrista precisa de a conhecer, de identificar as suas características e os seus pontos de cedência, para com ela negociar o processo de modelação. No fundo, é necessário compreender a agência do material, estudando-o, quase como um etnógrafo do barro (Seixas 2021). Esta observação do material acontece através de uma interação organizada, que combina as ações do artesão e das suas mãos, com as da matéria, num jogo de flexibilidade, resistência e cedências de parte a parte. Do equilíbrio desta relação entre a pessoa humana e o barro mais-do-que-humano, e da sua atividade conjunta, surge o objeto (Malafouris 2014).
Imagem 5: Sarronco, de António Ramalho (2024) sobre esboços da obra.
Imagem 6 e 7: Esboços da obra Sarronco, de António Ramalho (2024).
Se as coisas que fazemos podem alterar a ecologia das nossas mentes (Wilson 1998: 5-6), também a forma como as fazemos, por exemplo, pelo tipo de envolvimento que estabelecemos com os outros, humanos e não-humanos, medeia a nossa relação com o mundo. Os barristas imergem num processo performativo, de investigação e de engajamento com o material, que é simultaneamente mental e físico, pois associam o conhecimento técnico, que conseguem transmitir, ao conhecimento tácito (Polanyi 2009 [1966]), que apenas podem expressar através da sua prática. Igualmente, compreender a performance implicada dos meus interlocutores - artesãos e barro - parece transpor os limites da linguagem e das possibilidades da minha etnografia até à data, sugerindo a necessidade de outras linhas de questionamento.
«Antropologia É Arte É Sapo?»[7]
Nas palestras «Antropologia Não é Etnografia» (2008), e dez anos mais tarde, em «Arte e Antropologia para um Mundo Sustentável» (2018)[8], Tim Ingold interrogava a relação entre a etnografia e a antropologia, afirmando tratarem-se de práticas autónomas. Destacando as diferenças, o autor argumentava que o hiato temporal entre o momento de observação e o posterior registo etnográfico cria distância, gerando uma relação tangencial, que a antropologia pode adensar com a imersão no terreno, estudando «com as pessoas» (Ingold 2008: 82). Onde a etnografia enquadra e contextualiza o ‘outro’, negando-lhe a contemporaneidade (Fabian 1983), e convertendo-o em expressão material, a antropologia estabelece relações coevas e de «correspondência» (Ingold 2008: 83). Para Ingold, a antropologia, ao contrário da etnografia, não procura produzir afirmações e obter respostas sobre as realidades estudadas, mas levantar questões e aprender com os interlocutores (Ingold 2018: 606).
Apesar de outros autores contemporâneos partilharem esta perspetiva (McLean 2017, Rees 2018), importa referir que as críticas ao etnocentrismo de algum trabalho de campo etnográfico remontam ao início da disciplina, traçando uma longa história de dissenso (Nader 2011), cujos momentos mais marcantes foram definidores da própria história da antropologia (ver Clifford & Marcus 1986, Marcus & Fischer 1999, Abu Lughod 1991, entre outros). A proposta de Ingold de autonomizar tanto a prática etnográfica como a antropológica sugere uma ampliação dos contributos individuais de ambas as disciplinas para o estudo de novas realidades ecológicas, mas também parece indicar incompatibilidades relativamente aos propósitos comuns, e questionar a importância do «encontro etnográfico» (Caria 2002) para o estudo antropológico, amplamente ensaiado pela antropologia (Gupta & Ferguson 1997), e por outras disciplinas, incluindo a arte (Sansi 2015).
Como as investigações da antropóloga Anna Lowenhaupt Tsing (2010, 2015) exemplificam, podemos conduzir estudos simultaneamente etnográficos e especulativos, e esta sincronia pode potenciar ambas as práticas e o trabalho conjunto da antropologia e da etnografia. O projeto «Atlas Feral» (Tsing et al. 2021), manifesta as possibilidades de colaborações entre etnografia, antropologia, arte, e outras disciplinas e conhecimentos, através de um caos organizado de descrições, análises, práticas, e correspondências criativas de realidades e ficções complexas, e mais-do-que-humanas.[9] Stuart McLean sugere algo similar, afirmando que a compreensão das realidades estudadas pela antropologia se veria amplificada com a utilização de outros métodos, a par do etnográfico, propondo que uma aproximação à experimentação desprendida levada a cabo pelas práticas artísticas poderia proporcionar envolvimentos antropológicos mais imaginativos (McLean 2017: 161). À centralidade humana, característica da antropologia clássica, sucederia uma disciplina ambígua e poética, aglutinadora de outras configurações de vidas e de conhecimentos, científico, tradicional e efabulatório (McLean 2017: 157).
Imagem 9: Esboços das obras: Cabra, Gigantona e Cavalo, de Rosa Ramalho (1960-1970).
Imagem 10: Desenho da obra Animal, de Rosa Ramalho (1960).
Imagem 8: Nota no caderno de campo sobre Animalia Paradoxa (2024).
Tentando colocar em prática a proposta teórica de uma dimensão antropológica mais especulativa, questiono que outros métodos posso ativar, a par da minha etnografia, e vejo-me enredada em questões. Como pode, na prática, a antropologia ser uma arte de questionamento, aceitando a incerteza e imergindo no desconhecido? Uma antropologia participativa e performativa pode emaranhar-se com o inumano (entidades não humanas, mais-que-humanas, e outras, como estes animais paradoxais), questionar a dicotomia observador-observado, e juntar-se a uma comunidade de diferentes, estudando com eles? Concordo que a viabilidade destas hipóteses aproximaria a antropologia da arte, em práticas partilhadas de observação, especulação, e participação em realidades em fluxo. Aliás, é assim que entendo as propostas de efabulação em barro dos meus interlocutores, como metáforas de exploração de novas formas de existência, e de desafio às fronteiras das suas realidades quotidianas. Mas pode a antropologia, como a figuração em barro, re-imaginar a sua realidade?
«Às vezes, por exemplo, desenhar»[10]
«A gente desenha uma linha assim, uma linha curva. E às vezes há coisas no barro que não dá para fazer. Quem trabalha no barro, tem de se adaptar, não dá assim, vou tentar fazer outra coisa. [O desenho] é a mesma coisa, mas de outra perspetiva».[11]
Inspirada por estas ideias, intercalo arte e antropologia para testar uma antropologia artística ou uma arte antropológica (Bakke & Petterson 2018), baseada em correspondências imaginativas com as realidades «inumanas» (McLean 2017: 87) criadas pelos artesãos, experimentando uma compreensão que articule o processo criativo da antropologia, e integre o método etnográfico que tenho vindo a usar na minha investigação.
Imagem 11: Mesa de trabalho com esboços e obras de Domingos Francisco (2024), Mina Gallos (2024) e António Ramalho (2024).
Experimentei participar na prática, modelando em barro com os artesãos de Barcelos, e os resultados foram promissores, mas a aprendizagem é demorada, não cabendo no tempo da minha investigação. Portanto, e seguindo a sugestão de António Ramalho, tentei pensar com o desenho sobre as minhas observações das relações e do conhecimento, técnico e tácito, dos meus interlocutores - artesãos, barro e criaturas. Observar, desenhar, e modelar - tudo implica seguir as coisas e os materiais, com os olhos e as mãos - ainda que, ao mesmo tempo, sejam também as coisas a orientar os nossos sentidos e os nossos gestos (Latour 1993).
Imagem 12: Desenho da obra Porco-Cavalo, de Rosa Ramalho (1960-1970).
Desenhar também pode ser modelar, e ao experimentar esta correspondência entre práticas, noto que consigo relacionar-me com os gestos das mãos dos barristas e com os objetos que estes criam. A simultaneidade «entre ver, inscrever e compreender» (Cabau 2016: 41) possibilita um entendimento do objeto, que expõe afinidades impercetíveis.[12] Porque o desenho é uma prática concreta, mas de raciocínio abstrato (Anderson 2019 [2017]), estabelece um paralelo com as dimensões sensorial e material da prática de figurar com o barro, aproximando-me do momento especulativo da criação desta Animalia Paradoxa, que, após quase três anos de terreno[13], me continua a inspirar e, sobretudo, a divertir!
Imagem 13: Desenhos das obras: Porco com diabo, de Júlia Côta (2023); Bicho-homem, autor desconhecido (c. 1899); Animal, de José Maria Rodrigues (s. d.); e Cabra, de Rosa Ramalho (1960-1970).
Nota: As fotografias e desenhos deste trabalho são da minha autoria, com a indispensável colaboração dos meus interlocutores, a quem agradeço.
Sónia Mota Ribeiro (CRIA NOVA FCSH)
soniamotaribeiro@gmail.com
Sónia Mota Ribeiro é antropóloga, artista, e investigadora nas áreas de antropologia da arte, antropologia do ambiente e património cultural. É doutoranda em antropologia (NOVA FCSH), integra o projeto exploratório IN2PAST, 2Legacy (2024-2025), e é licenciada e mestre em arte (FBAUP e FBAUL) e mestre em antropologia (NOVA FCSH). Mais informação: https://www.cienciavitae.pt/C612-1AB8-B390.