Artigos
Antonio Maria Pusceddu
Este artigo mobiliza as ecologias de valor como um quadro concetual para dar conta dos conflitos, contradições e dilemas decorrentes da experiência da crise socioecológica contemporânea. Baseia-se num trabalho de campo etnográfico em Brindisi,
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Axel Levin
This ethnographic article addresses the difficulties, practices, and strategies of the professionals of the only Argentine hospital fully specialized in the treatment of mental health problems of children and adolescents. More specifically, it
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Morena Freitas
As ibejadas são entidades infantis que, junto aos caboclos, pretos-velhos, exus e pombagiras, habitam o panteão da umbanda. Nos centros, essas entidades se apresentam em coloridas imagens, alegres pontos cantados e muitos doces que nos permitem
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Pablo Mardones
The article analyzes the Anata-Carnival festivity celebrated in the Andean town of Chiapa in the Tarapacá Region, Great North of Chile. I suggest that this celebration constitutes one of the main events that promote the reproduction of feelings of
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Marta Roriz
Partindo de desenvolvimentos na teoria etnográfica e antropológica para os estudos do turismo urbano, este ensaio oferece uma descrição das paisagens turísticas de Sarajevo pela perspetiva do turista-etnógrafo, detalhando como o tempo se
[+]Memória
Lorenzo Macagno
O artigo comenta, contextualiza e transcreve o intercâmbio epistolar que mantiveram, entre 1971 e 1979, o antropólogo social David J. Webster (1945-1989) e o etnólogo e funcionário colonial português, António Rita-Ferreira (1922-2014).
[+]Dossiê "Géneros e cuidados na experiência transnacional cabo-verdiana"
Luzia Oca González, Fernando Barbosa Rodrigues and Iria Vázquez Silva
Neste dossiê sobre o género e os cuidados na comunidade transnacional cabo-verdiana, as leitoras e leitores encontrarão os resultados de diferentes etnografias feitas tanto em Cabo Verde como nos países de destino da sua diáspora no sul da
[+]Dossiê "Géneros e cuidados na experiência transnacional cabo-verdiana"
Fernando Barbosa Rodrigues
Partindo do terreno etnográfico – interior da ilha de Santiago de Cabo Verde – e com base na observação participante e em testemunhos das habitantes locais de Brianda, este artigo é uma contribuição para poder interpretar as estratégias
[+]Dossiê "Géneros e cuidados na experiência transnacional cabo-verdiana"
Andréa Lobo and André Omisilê Justino
Este artigo reflete sobre a categoria cuidado quando atravessada pelas dinâmicas de gênero e geração na sociedade cabo-verdiana. O ato de cuidar é de fundamental importância para as dinâmicas familiares nesta sociedade que é marcada por
[+]Dossiê "Géneros e cuidados na experiência transnacional cabo-verdiana"
Luzia Oca González and Iria Vázquez Silva
Este artigo toma como base o trabalho de campo realizado com mulheres de quatro gerações, pertencentes a cinco famílias residentes na localidade de Burela (Galiza) e aos seus grupos domésticos originários da ilha de Santiago. Apresentamos três
[+]Dossiê "Géneros e cuidados na experiência transnacional cabo-verdiana"
Keina Espiñeira González, Belén Fernández-Suárez and Antía Pérez-Caramés
The reconciliation of the personal, work and family spheres of migrants is an emerging issue in migration studies, with concepts such as the transnational family and global care chains. In this contribution we analyse the strategies deployed by
[+]Debate
Filipe Verde
Este artigo questiona a consistência, razoabilidade e fecundidade das propostas metodológicas e conceção de conhecimento antropológico da “viragem ontológica” em antropologia. Tomando como ponto de partida o livro-manifesto produzido por
[+]Debate
Rogério Brittes W. Pires
O artigo “Estrangeiros universais”, de Filipe Verde, apresenta uma crítica ao que chama de “viragem ontológica” na antropologia, tomando o livro The Ontological Turn, de Holbraad e Pedersen (2017), como ponto de partida (2025a: 252).1 O
[+]Debate
Filipe Verde
Se há evidência que a antropologia sempre reconheceu é a de que o meio em que somos inculturados molda de forma decisiva a nossa compreensão do mundo e de nós mesmos. Isso é assim para a própria antropologia e, portanto, ser antropólogo é
[+]Debate
Rogério Brittes W. Pires
Um erro do construtivismo clássico é postular que verdades alheias seriam construídas socialmente, mas as do próprio enunciador não. Que minha visão de mundo, do fazer antropológico e da ciência sejam moldadas por meu ambiente – em
[+]Nota sobre a capa
Pedro Calapez
© Pedro Calapez. 2023. (Pormenor) Díptico B; Técnica e Suporte: Acrílico sobre tela colada em MDF e estrutura em madeira. Dimensões: 192 x 120 x 4 cm. Imagem gentilmente cedidas pelo autor. Créditos fotográficos: MPPC / Pedro
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Mafalda Carapeto
Este artigo surge no seguimento do trabalho etnográfico realizado num aeroporto em Portugal, onde de junho de 2021 a abril de 2022 acompanhei nos vários grupos e turnos o quotidiano dos inspetores do Serviço de Estrangeiros e Fronteiras (SEF). A
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Ana Silvia Valero, María Gabriela Morgante y Julián Cueto
Este trabalho pretende dar conta das interseções entre diferentes aspetos da vida quotidiana e das trajetórias de vida das pessoas idosas num espaço de bairro e a incidência da pandemia de Covid-19. Baseia-se no desenvolvimento sustentado,
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Liliane Moreira Ramos
Neste artigo discuto as reconfigurações do fenômeno chamado de culture jamming, característico da dimensão comunicativa do consumo político, a partir da apropriação de memes da Internet como uma ferramenta de crítica ao consumo. Com base na
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Jordi Nofre
The historical neighbourhood of Bairro Alto is the city’s most iconic nightlife destination, especially for tourists visiting Lisbon (Portugal). The expansion of commercial nightlife in this area has been accompanied by the increasing presence of
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Imelda Aguirre Mendoza
This text analyzes the term of force (mana’ap) as a native concept formulated by the pames (xi’iui) of the Sierra Gorda de Querétaro. This is related to aspects such as blood, food, cold, hot, air and their effects on the body. It is observed
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Mariana da Costa Aguiar Petroni e Gabriel K. Kruell
In this article we present an exercise of reflection on the challenges involved in writing and studying the biographies and autobiographies of indigenous intellectuals in different geographical, historical and political scenarios: Mexico and Brazil,
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Douglas Ferreira Gadelha Campelo
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Emilene Leite de Sousa e Antonella Maria Imperatriz Tassinari
Este artigo analisa as experiências das crianças Capuxu com os animais de seu convívio diário, buscando compreender como as relações das crianças com estas espécies companheiras atravessam o tecido social Capuxu conformando o sistema
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Elizeu Pinheiro da Cruz e Iara Maria de Almeida Souza
Ancorado em anotações elaboradas em uma etnografia multiespécie, este texto formula uma leitura de laboratórios de ciências biológicas como práticas situantes de atores humanos e não humanos. Para isso, os autores trazem à baila plantas
[+]Interdisciplinaridades
Vanessa Forneck e Eduardo Rocha
Esta pesquisa cartografa e investiga os territórios criados em decorrência do abandono das estações férreas, acentuado a partir dos anos 1980, nas cidades gêmeas de Jaguarão-Rio Branco e Santana do Livramento-Rivera, na fronteira
[+]Multimodal Alt
Giulia Cavallo
Em 2016, três anos depois de ter concluído o doutoramento, embarquei numa primeira tentativa de traduzir a minha pesquisa etnográfica, em Maputo entre igrejas Zione, para uma linguagem gráfica. Através de uma série de ilustrações
[+]Recursividades
Alejandro Vázquez Estrada e Eva Fernández
In this text we address the possibility of deconstructing the relationships – that have water as a resource available to humans – that have ordered some dichotomies such as anthropos-nature, establishing that there are methodologies, theories
[+]Argumento
Filipe Verde
Neste ensaio procuro primeiro identificar as razões do lugar marginal que a arte desde sempre ocupou no pensamento antropológico, sugerindo que elas são a influência da conceção estética de arte e da metafísica que suportou o projeto das
[+]Recensões
Diogo Ramada Curto
Celso Mussane (1957-) é um pastor evangélico moçambicano. Licenciou-se na Suécia (1994) e tirou o curso superior de Teologia Bíblica na Pontifícia Universidade Católica do Paraná, em Londrina no Brasil (2018). Entre 2019 e 2020, publicou
[+]Recensões
Francisco Martínez
Este libro tiene tres dimensiones analíticas: primero, es una etnografía del movimiento de cultura libre en Madrid. Segundo, es un estudio histórico sobre la traducción de lo digital a lo urbano, favoreciendo una nueva manera de posicionarse en
[+]Este texto, de natureza etnobiográfica, dá conta das estratégias de comunicação entre um idoso institucionalizado, em tempo de covid-19, e a sua família. Procura mostrar que nem todas as pessoas compreenderam, verdadeiramente, em que consistiu essa pandemia. Um idoso surdo e com Parkinson usou a sua epistemologia para definir o que seria uma gripe global. A família, em face das dificuldades de audição e compreensão do seu familiar com doença neurológica, encontrou no “método de Paulo Freire” uma forma de potenciar conversa e reflexão a partir de palavras-chave e do seu próprio entendimento e experiência cultural.
https://doi.org/10.25660/agora0022.djng-gf14
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Quando a uma relativa institucionalização de sucesso, num lar de idosos, se junta uma alteração profunda dos ritmos quotidianos, conjuntamente com o agravamento e acumular de diversas doenças, os utentes podem não ter condições pessoais para fazer nova recontextualização por forma a entender, por exemplo, que o vírus SARS-Cov2 não é uma simples gripe e que implica isolamentos físicos profundos a que nem as proximidades afetivas e sociais de cuidadores e familiares, manifestadas in loco, com máscaras que só haviam visto a médicos, enfermeiros e dentistas, ou, via telefone ou por videoconferência, conseguem minimizar os prejuízos para com as já relativa qualidade de vida pessoal e social. Podem não conseguir perceber as alterações vistas nos outros e promovidas para si próprios (Vieira, 2014). E tal mudança de práticas, se alterar a autoidentidade, essa imagem de si próprios e essa autoconfiança, bem como se ficar por compreender toda a alteração da gestão dos espaços e dos confinamentos que a Covid-19 implicou, a pessoa pode ficar noutro registo de compreensão que nada tem a ver com o real vivido pelos cuidadores (Vieira e Vieira, 2020). Pode, inclusivamente, levar a que o sujeito fique noutro registo de entendimento que, visto de fora (Vieira, R. e al., 2018), poderá ser classificado de patológico quando, na verdade, trata-se, simplesmente, dum entendimento assente numa mente cultural (Iturra, 1990) descontextualizada com o presente vivido (Frazão e Vieira, 2020).
O Sr. Albino perdera a sua esposa há um ano. Estavam os dois institucionalizados num lar de idosos, próximo da sua casa, o seu outro lar, o doméstico, há cinco anos, ele, há um ano, ela.
2020 e, particularmente, a pandemia do Covid-19, trouxe ao Sr. Albino não só uma vida mais isolada dentro do lar como, também, mais dificuldades acrescidas de comunicação, dada a sua surdez profunda. “Perdi a minha esposa”, dizia, “que tanta falta me faz”. Mas trouxe, também, com o Covid-19, a ausência daquela visita que era regular, a do filho.
Esta sua visita era projetada antecipadamente, por vezes no sábado ou domingos anteriores, com sugestões de almoço a seu modo, nem que fosse apenas aquilo de que tanto gostava e tantas vezes se habituou a comer como resposta a urgências quotidianas: uma lata de sardinha de conserva com pão e vinho.
O maior isolamento, a menor interação social e a ausência da tradução de ideias por parte da esposa, que lhe repetia perguntas dela ou de outros e lhe explicava com escassas palavras para simplificar raciocínios complexos que, por vezes, já não só não ouvia como também não entendia, acabaram por contribuir para o aumento progressivo da sua surdez, que há muito combatia com a ajuda das próteses auditivas mais poderosas do mercado.
O filho recorreu, então, ao uso de palavras escritas, palavras soltas, mas palavras do quotidiano e vivência do pai, para lhe dar pistas e gerar motivação e discurso pertinente e afim (Bernardo & Vieira, 2020). E assim o Sr. Albino começou a ter conversas em que falava, por vezes, a partir dessas palavras, entre 5 a 10 minutos por cada tema que as mesmas geravam. Estava descoberto um caminho para que a interação não fosse apenas visual e de conversa unidirecional.
Quando, mais tarde, no verão de 2020, o Sr. Albino começou a ter visitas presenciais, uma vez por semana, marcadas entre as diversas solicitações semelhantes de familiares de outros utentes, a separação interpessoal e física continuou grande, pois o vidro que o separava do exterior aumentava ainda mais a dificuldade de audição. De novo as palavras-chave que lhe faziam sentido e o permitiam entender e desenvolver alguma conversa e ganhar ânimo e sentido de vida com a interação com os visitantes.
Contudo, nem assim foi possível que o Sr. Albino compreendesse, verdadeiramente, a razão daquela impossibilidade de sair e ir a sua casa tal como anteriormente. O filho falava-lhe duma gripe forte. Ele dizia que não estava gripado. A lista das palavras chave passaram a integrar “Gripe Mundial”, “Gripe Global”... Mesmo assim o Sr. Albino nunca entendeu o verdadeiro significado de uma pandemia.
Nas videochamadas para o lar, face à dificuldade em comunicar, essencialmente por não ouvir, a estratégia compensatória usada pelos familiares passava por apresentar palavras-chave que o Sr. Albino lia no computador recetor, através das quais conseguia começar uma conversa, fazer perguntas ou dar respostas, qual método de Paulo Freire (1997) aqui adequado a quem tinha de processar pensamento e ação a partir de formas alternativas ao entendimento auditivo.
Tratava-se de provocar reflexões e desenvolvimento de narrativas que dão sentido à vida e produzem atividade cerebral no idoso, bem como, consequentemente, qualidade de vida.
Certo dia, numa dessas visitas separadas pelo vidro, começou a chover e o Sr. Albino, ainda muito atento aos pormenores que conseguia decifrar justamente por fazerem parte do seu mundo cultural, alertou o filho para a chuva e disse: “Abre o chapéu que está a chover... Se apanhas o vírus estamos tramados! Quem é que depois trata de mim?”.
Ricardo Vieira (ESECS.IPLeiria , CICS.NOVA.IPLeiria)